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Anarquista,
Sinto lhe dizer, mas educação é uma forma de adestramento, caso por esta palavra você entenda (como eu) qualquer forma de transmitir habilidades por meio de um treinamento específico. Você se vale, se não me engano, das ressonâncias que a palavra adestramento possui, já que é mais tipicamente aplicada a cães do que a homens. Mas, se você tomar a palavra em sua acepção mais geral, poderá aplicá-la à educação independentemente de suas convicções mais profundas. Usada assim, ela é neutra. O que fazemos, ao educar uma criança, é lhe transmitir habilidades (como a de compreender uma notícia de jornal, ou ser capaz de tocar uma peça ao piano com sentimento e inteligência) por meio de um treinamento específico, que não precisa incluir, fique tranqüila, recompensas idiotas, como um ossinho, ou coisa assim. Quando inclui recompensas exteriores à própria atividade (e não é sempre que isto precisa acontecer), elas podem ser de um tipo que um cachorro não conseguiria perceber enquanto tais. Recompensas simbólicas associadas à auto-imagem, por exemplo. Isso não exclui de maneira alguma a liberdade. Pelo contrário. O exercício dessas habilidades dará acesso a um tipo superior de liberdade. Eu, por exemplo, que estou dando meus primeiros passos na clarineta, adoraria adquirir a liberdade de tocar André de Sapato Novo, que hoje eu infelizmente não tenho. Só o processo de adestramento pode criar para mim esse novo espaço para o exercício da liberdade. Ler Machado de Assis não é muito diferente. Conseguir acompanhar uma aula de cálculo no primeiro ano da faculdade também não. São habilidades adquiridas, e necessitam de um treinamento específico.
A centralização, por outro lado, não é um objetivo em si. É uma necessidade contingente. As políticas caóticas sucessivas, aliadas ao fato de a educação nunca ter sido realmente priorizada levaram-nos a essa situação de completo sucateamento físico e simbólico: instalações precárias, professores despreparados, sistemas de avaliação em frangalhos. Nossa diferença talvez seja a seguinte, neste ponto: você vê a possibilidade de esse sistema em ruínas adquirir um dinamismo próprio no sentido da melhora a partir de ações isoladas. Eu não vejo as coisas assim. Não que seja impossível. Não é. Podemos imaginar dinamismos criados assim. Mas uma condição indispensável, eu acho, seria estarmos partindo de um outro patamar. Esse sistema que está aí, entregue às suas próprias tendências, irá cada vez mais para o fundo. É preciso, eu acho, uma intervenção externa, que recoloque o trem nos trilhos. Temos que ter políticas de longo prazo, e sobre isso é bem provável que nossa discordância seja pequena. Mas também temos que ter respostas imediatas para as crianças que estão aí. À medida que formos reciclando os professores, aí sim é possível pensar em ir soltando as rédeas, e deixando o sistema avançar de forma descentralizada. Nas condições atuais, acho uma temeridade. Mas esta impressão minha tem toda a fragilidade inevitável dos prognósticos condicionais - "o que aconteceria se...". A sua também. Fazer o quê? É dessa matéria sutil que as opções políticas são feitas...
Anarquista,
A avaliação individual do CNPq, com a concessão de bolsas de produtividade em pesquisa, assim como as avaliações institucionais da CAPES tiveram um papel fundamental na indução de qualidade no ensino superior. Isso é tão visível que ninguém pensa seriamente em abolir o sistema. Pode-se pensar em aperfeiçoá-lo, isto sim. Mas isto não é um bom argumento contra o sistema tomado em si mesmo. Pelo contrário. Não teria sentido pensarmos em aperfeiçoar um sistema reconhecidamente nocivo.
É possível burlar as regras? É sempre possível burlar as regras. Mas não é porque as pessoas passam no sinal vermelho que nós iremos concluir que os semáforos deveriam ser extintos. Eles introduzem uma ordem relativa no trânsito, apesar das transgressões. Sem eles, os acidentes seriam muito mais numerosos. Com as avaliações, acontece algo semelhante.
Pelo que me consta, experiências semelhantes (bonificação por resultados) já foram implementadas pelo Estado de Minas Gerais. Alguém tem algum conhecimento sobre isso ?
João Vergílio Gallerani Cuter said:Anarquista,
A avaliação individual do CNPq, com a concessão de bolsas de produtividade em pesquisa, assim como as avaliações institucionais da CAPES tiveram um papel fundamental na indução de qualidade no ensino superior. Isso é tão visível que ninguém pensa seriamente em abolir o sistema. Pode-se pensar em aperfeiçoá-lo, isto sim. Mas isto não é um bom argumento contra o sistema tomado em si mesmo. Pelo contrário. Não teria sentido pensarmos em aperfeiçoar um sistema reconhecidamente nocivo.
É possível burlar as regras? É sempre possível burlar as regras. Mas não é porque as pessoas passam no sinal vermelho que nós iremos concluir que os semáforos deveriam ser extintos. Eles introduzem uma ordem relativa no trânsito, apesar das transgressões. Sem eles, os acidentes seriam muito mais numerosos. Com as avaliações, acontece algo semelhante.
Anarquista,
A avaliação individual do CNPq, com a concessão de bolsas de produtividade em pesquisa, assim como as avaliações institucionais da CAPES tiveram um papel fundamental na indução de qualidade no ensino superior. Isso é tão visível que ninguém pensa seriamente em abolir o sistema. Pode-se pensar em aperfeiçoá-lo, isto sim. Mas isto não é um bom argumento contra o sistema tomado em si mesmo. Pelo contrário. Não teria sentido pensarmos em aperfeiçoar um sistema reconhecidamente nocivo.
É possível burlar as regras? É sempre possível burlar as regras. Mas não é porque as pessoas passam no sinal vermelho que nós iremos concluir que os semáforos deveriam ser extintos. Eles introduzem uma ordem relativa no trânsito, apesar das transgressões. Sem eles, os acidentes seriam muito mais numerosos. Com as avaliações, acontece algo semelhante.
É, acho que chegamos num ponto ideal da discussão: conhecemos melhor a posição do outro, e vimos onde é que a nossa precisa ser burilada. Na minha opinião, há dois caroços na garganta da esquerda atualmente, dois nós que precisam ser desatados para que um NOVO pensamento de esquerda possa brotar: educação e segurança pública. Na educação, a esquerda precisa se acostumar com a idéia da avaliação e do primado do mérito. Abraçar estas duas idéias como causas, e não como "males necessários", ou coisa assim. Na segurança pública, precisa fazer as pazes com o uso legítimo da violência e com a idéia de penalidade - é um longo assunto. A discussão escandaliza, mas é aí que estamos patinando, que não conseguimos propor soluções viáveis, que confundimos o ideal (que é um horizonte) com a realidade (que é o solo em que estamos condenados a caminhar). Temos que romper de vez com a sombra que a Igreja projetou sobre nós. Recolocar o ideal da igualdade e da justiça social num outro plano, onde caiba a administração do presente e a condução do aparelho de Estado. Afinal, se alguém não percebeu, é o Lula que está no poder. Provavelmente fará seu sucessor. Temos que ter a coragem de nos repensarmos. Desculpem-me por este "até logo" pretencioso, em tom admoestatório. Mas é a minha crença. Blog tem um pouco de confessionário, não tem? Pois é. Abraço a todos.
Grande problema das fórmulas atuais é que os governos não têm uma política educacional, por isso lançam um projeto, fazem festa e depois o esquecem na gaveta, como foi o caso da nova política educacional instituída pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação).
Por termos essa doença na administração pública, ficamos discutindo a muito se é válido ou não um mecanismo isolado do todo, seja a aprovação automática ou as metas e remuneração por desempenho.
Os mecanismos não são ruins, não, por que funcionam em qualquer lugar que tenha uma política educacional e essas ferramentas sejam coerentes com essa estratégia.
Fica claro esse ponto de vista, só de ler todos os textos enviados pelos leitores desse espaço, mesmo no blog, ninguém colocou nenhum ponto da política de educação paulista, mesmo quem tentou defender, ficou claro que a política era o mecanismo.
Por isso, desde o enterro da escola padrão não temos nessa área como ser contra a uma política pública do governo paulista, afinal não se pode ser contra o que não existe, as colocações principalmente de quem trabalha na rede pública são claras, são “gritos” pedindo que o governo saia das trevas e tenha coragem de fazer política até para ser criticado.
Eu como cidadão diferentemente fico estarrecido, afinal os números são claros, pelo mesmo porcentual de São Paulo, nós temos resultados infimamente piores que todos os sistemas educacionais em termos de qualidade do mundo, mas aí está impropriedade não podemos colocar São Paulo com outros países, só Estados Brasileiros, afinal no exterior existem políticais educacionais.
Concluindo: Sem política educacional é quase impossível o Estado de São Paulo recuperar-se em termos de qualidade, esperamos agora que saiu a política de RH para profissão, começe algo mais substâncial, pensando no todo, e não apenas em paleativos.
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