Quarta, 15 de abril de 2009, 08h11 Acupuntura faz efeito? NYT/Reprodução
Espinhoso. "Parece absurdo proibir médicos chineses, radicados no Brasil, de praticarem a medicina que aprenderam no seu país de origem", critica Brito
Ronaldo Correia de Brito
Do Recife (PE)
Você acredita que a acupuntura faz algum efeito? Ainda existe muita desconfiança no Brasil em relação a essa forma de tratamento, tão antiga e popular na China. O rótulo de medicina alternativa só faz piorar a imagem da acupuntura, pois as matérias jornalísticas misturam diversas terapias como se fossem a mesma coisa.
A acupuntura é uma especialidade reconhecida pela Associação Médica Brasileira - AMB, como ginecologia, pediatria, nefrologia e todas as outras especialidades. Nos últimos anos ela ganhou prestígio, é ensinada em algumas faculdades e surgiram cursos de formação.
Antigamente, ela era praticada apenas por médicos chineses, que vieram morar no Brasil, e os pacientes, em geral, só buscavam no tratamento o alívio para a dor. Hoje, é usada por pessoas que tomaram conhecimento dos seus benefícios em várias doenças.
Quando surgiram os primeiros casos de AIDS, ainda não se usava agulha descartável nas sessões de acupuntura. As campanhas de prevenção passaram a apontá-la entre os fatores de risco. Muita gente ficou aterrorizada e os consultórios dos acupunturistas se esvaziaram. Bastou o uso de agulhas descartáveis ou individuais para reverter esse medo.
A Associação Médica de Acupuntura no Brasil quer que a especialidade seja praticada apenas por médicos com formação em nossas universidades. Parece absurdo proibir médicos chineses, radicados no Brasil, de praticarem a medicina que aprenderam no seu país de origem, bem como outros profissionais de saúde.
Cada vez mais a acupuntura é procurada como tratamento. Os planos de saúde pagam as consultas como as de qualquer outra especialidade e uma portaria do SUS (Sistema Único de Saúde) tornou-a acessível a todas as classes sociais, através de seus serviços de saúde.
Encontrei num corredor de hospital uma médica psiquiatra. Falamos de um paciente que há tempo lutava contra a depressão, tomando vários medicamentos, sem bom resultado. Ela se mostrava surpresa com a melhora que ele apresentara nos últimos meses. Falei que o paciente havia procurado um acupunturista chinês, e que desde o início da aplicação das agulhas apresentara grande melhora. A psiquiatra argumentou que não acreditava em acupuntura, que a melhora talvez se devesse ao manejo de algum novo medicamento.
Esse tipo de recusa às formas de medicina, que fogem ao modelo biomédico, é comum na profissão pela falta de interesse em conhecer outras terapêuticas. Muitos não consideram os danos de uma intoxicação medicamentosa nem os ganhos com um tratamento não químico.
O mais justo seria trabalhar com terapias complementares, não descartando os bons resultados dos medicamentos nem da acupuntura. Mas o que está em jogo é o poder sobre a cura, o lucro da indústria farmacêutica e o crescente uso de próteses desnecessárias. Reconhecer que a medicina chinesa possui valor é abrir mão desse poder único a que chamam ciência e que está ligado a um imaginário de Ocidente. Mesmo que vez por outra essa ciência mostre o seu lado calamitoso.
Ronaldo Correia de Brito é médico e escritor. Escreveu Faca, Livro dos Homens e Galiléia.
(extraído do Terra Magazine)