Julian Casablancas, líder do Strokes, banda de sucesso no mundo pop, no último Festival de Coachella, EUA, desdenhou do jazz duvidando de que alguém possa gostar desse gênero. Imagine, então, o que diria da música erudita. Deveria ouvir Joanna MacGregor e, se for um pouco inteligente, irá rever seus conceitos. Pode ser boutade de garoto bem-nascido metido a bacana, que é o que é, independentemente de seu talento em produzir um som acessível e agradável para a maioria da população jovem.
A formação de Jonna MacGregor é clássica. Estudou música na Royal Academy of Music de Londres e também na escola Van Cliburn de piano, nos EUA. Registrou pela gravadora Collins obras de Debussy, Ravel, Messiaen e Britten, além dos “antigos” Bach e Scarlatti. Por esses dados, pode-se dizer que a pianista tem uma carreira como a de tantos outros virtuoses.
Muito pelo contrário, não há nada de ortodoxo em Joanna; a começar pelo visual. Essa mulher nascida em 1959, portanto uma cinquentona, tem o cabelo cheio de trancinhas afro que “voam” durante suas performances. Há uma energia transbordante que emana à sua simples presença e, com sua música, a mesma coisa. Fez uma turnê pela América Latina, em 2007, apresentando-se, inclusive, em São Paulo, no Teatro Cultura Artística. A que fez na Argentina, no Teatro Coliseu, foi gravada e lançada no CD Live in Buenos Aires.
A primeira peça apresentada com a Britten Sinfonia é o Concerto para cravo e cordas em ré menor BWV 1052. Nossos ouvidos são invadidos por uma avalanche de sons como lufadas de notas que, encadeadas e combinadas, penetram em nossos corpos e mentes. Meio que atônitos e resfolegantes, experimentamos um momento de calma no belo adágio desse concerto. A beleza devastadora, anunciada desde o início, busca o sublime na interpretação enérgica da pianista.
A beleza fria e algo dramática do Concerto em ré maior para orquestra, de Igor Stravinsky, serve como uma espécie de preparação para o set com três obras de John Dowland – Forlorn Hope Fancy, Mr. Dowland’s Midnight, e Can She Excuse – arranjadas por MacGregor. Mr. Dowland’s Midnight é um dos pontos altos com arranjo em que os baixos de Markus Van Horn e Roger Linley se complementam ao piano de Joanna. Se a apresentação tivesse parado por aí, teria bastado. Para ser mais surpreendente ainda, adentra pelo terreno crossover tocando duas peças de Egberto Gismonti – Forrobodó e Frevo –, Milonga del ángel e Libertango, de Astor Piazzolla e Last Round do argentino de origem judaica, Osvaldo Golijov.
Joanna MacGregor é um perfeito exemplo de que a música não deve se limitar a um gênero só. E serve bem para quebrar com alguns preconceitos e é uma amostra de quão amplo é o universo musical.
Ouça Milonga del ángel, de Piazzolla da apresentação em Buenos Aires.
Veja um trecho de uma apresentação de Joanna MacGregor e a Britten Sinfoinia com Dhafer Youssef.
acho ótima esta idéia de romper com estas fronteiras e este rompimento fica mais autorizado quando perpetrado (esta é boa, confessa!) por alguém que vem do clássico...
mas queria mais desta moça interpretando piazzola e gismonti. não achei... sniff... sniff... mas a achei com bach... ou bach por ela... um pedacinho... e vale a pena, viu?